Problemas Técnicos
À minha frase 'Ainda estou para perceber qual a justificação constitucional para convocar eleições antecipadas ...', comentário a um post do meu amigo CC, respondeu-me este com um simples e directo: 'AR, se leres o artº 195º da CRP encontras a "justificação constitucional" que procuras'. Fui ler.
Reza assim o artº 195º da CRP:
"1. Implicam a demissão do Governo:
a) O início de nova legislatura;
b) A aceitação pelo Presidente da República do pedido de demissão apresentado pelo Primeiro-Ministro;
c) A morte ou impossibilidade física duradoura do Primeiro-Ministro;
d) A rejeição do programa do Governo;
e) A não aprovação de uma moção de confiança;
f) A aprovação de uma moção de censura por maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções.
2. O Presidente da República só pode demitir o Governo quando tal se torne necessário para assegurar o regular funcionamento das instituições democráticas, ouvido o Conselho de Estado."
Lidas as diversas alíneas com algum cuidado (e relidas), continuo a não encontrar a tal justificação constitucional. A tal para a dissolução do Parlamento e a convocação de novas eleições, entenda-se.
Fui ver as competências do PR. Artº 133º da CRP:
Compete ao Presidente da República, relativamente a outros órgãos:
...
e) Dissolver a Assembleia da República, observado o disposto no artº 172º, ouvidos os partidos nela representados e o Conselho de Estado;
f) Nomear o Primeiro-Ministro, nos termos do nº 1 do artigo 187º;
g) Demitir o Governo, nos termos do nº 2 do artigo 195º e exonerar o Primeiro-Ministro, nos termos do nº 4 do artigo 186º;
...
Também aqui não encontro justificação constitucional para a dissolução do Parlamento.
Ora, resultando daqui que não existe motivo constitucional para a dissolução, resta a opção política.
Aquilo que a oposição, e com particular ardor o BE, defende é que a derrota eleitoral de há poucas semanas justifica a dissolução do Parlamento. O argumento é notável.
As eleições foram para o Parlamento Europeu. Apesar disso, devem ter repercussões internas, justificando a dissolução do Parlamento nacional. Mas isso apenas se o PM se demitir (e nesta altura já sabemos que se vai demitir). Porque se isso não acontecesse, então não haveria lugar à dissolução do Parlamento. Ou seja, se se mantivesse o mesmo PM e o mesmo mau governo (no dizer da Oposição) então ficava tudo na mesma. Por conseguinte, a prática democrática e constitucional de procurar uma solução dentro do quadro parlamentar não vale. E não vale porque não. O Parlamento tem legitimidade para manter o governo actual mas não tem para procurar uma solução para formar um novo governo, no âmbito do mesmo quadro e no seio da mesma maioria. Que, segundo a Oposição, não tem legitimidade. Uma maioria parlamentar eleita há dois anos não tem legitimidade porque ... perdeu umas eleições para o Parlamento Europeu!
Eu sei que a Oposição que temos é uma Oposição da treta. Que, em particular, a do BE é trauliteira. Mas que hajam pessoas de bom senso, nomeadamente no PS, a seguir essa lógica para-revolucionária é que me deixa espantado.
AR