Friday, August 27, 2004

A Rita ...

... foi-se embora. Deixou-nos.
A Rita seguiu a vida dela e isso é bom. Perdemos nós, que somos seus amigos e fomos colegas durante quase dois anos. Que a acompanhamos na sua maternidade e ficámos felizes com o nascimento da Matilde. Que também lhe aturávamos as irritações e nos divertiamos quando ela fazia ou dizia algum disparate.
A Rita é daquelas pessoas que não vai ficar nos compêndios de História. Mas vai ficar no coração dos seus amigos. Vai trabalhar para Constância e ter muito filhos na casa que vai contruir. Vai ter muitas arrelias e vê-los crescer com prazer. Dedicar-se a eles e a uma vida simples e sã. A Rita vai ser a Avó que todos gostaríamos de ter, e vai ter um 'rancho' de netos. Vai ter sempre aquele sorriso simples e sem maldade, e a perspectiva simples da vida.
E quando a visitar (espero que sejam muitas vezes) vou sentir sempre, secretamente, alguma inveja da sua felicidade.
AR

Thursday, August 26, 2004

Convicções

Não tendo simpatias de maior pelo ideário de esquerda (pelo menos com uma parte significativa dele) tenho-as por algumas pessoas que militam naquela área política. Aliás, por regra, tenho simpatia por quem tem convicções quando estas não ofendem os princípios, que tenho por elementares, de Cidadania, Democracia e Liberdade. Vem isto a propósito de Manuel Alegre e da sua candidatura à liderança do PS.
Ao contrário de muita gente da minha área política não sou apologistas do “quanto pior, melhor”. José Sócrates está ao nível, grosso modo, de Pedro Santana Lopes. Não falará dos Violinos mas não consegue dizer mais do que o conjunto de banalidades costumeiras. É o pior.
Manuel Alegre é um homem de convicções. É certo que não as partilho, mas integram-se no tal quadro de Cidadania, Democracia e Liberdade. Muitos dirão que apenas tem passado. Eu direi que os homens de convicções, como ele, têm sempre futuro. Porque as convicções e os ideais, contrariamente ao que as luminárias de serviço querem fazer crer, não são passado nem estão fora de moda.
Ainda que outro resultado não tivesse, a candidatura de Manuel Alegre tem tido a qualidade de dizer que a Política não precisa de ser a barrasquice trauliteira em que se caiu nos últimos anos, mas pode (e deve, digo eu) ser um espaço de debate de ideias e de propostas.
E nunca terá vindo mais a propósito o poema escrito pelo próprio Manuel Alegre e que abriu o seu primeiro livro de poesia, Praça da Canção, publicado em 1965:

Apresentação

Cantar não é talvez suficiente.
Não porque não acendam de repente as noites
tuas palavras irmãs do fogo
mas só porque as palavras são
apenas chama e vento.

Eu venho incomodar.
Trago palavras como bofetadas
e é inútil mandarem-me calar
porque a minha canção não fica no papel.
Eu venho tocar os sinos.
Planto espadas
e transformo destinos.
Os homens ouvem-me cantar
e a pele
dos homens fica arrepiada.
E depois é madrugada
dentro dos homens onde ponho
uma espingarda e um sonho.

E é inútil mandarem-me calar.
De certo modo sou um guerrilheiro
que traz a tiracolo
uma espingarda carregada de poemas
ou se preferem sou um marinheiro
que traz o mar ao colo
e meteu um navio pela terra dentro
e pendurou depois no vento
uma canção.

Já disse: planto espadas
e transformo destinos.
E para isso basta-me tocar os sinos
que cada homem tem no coração.


in Manuel Alegre - Obra Poética, Publicações D. Quixote, Lisboa, 1999.

AR

Wednesday, August 25, 2004

Premonição?

Este governo não cairá porque não é um edifício, sairá com benzina
porque é uma nódoa.


Eça de Queiroz

Tuesday, August 24, 2004

Desculpem lá o atraso

Eu não sei se houve fraude na Venezuela. Até ver, não há sinal de que isso tenha acontecido. Assim sendo, a vitória de Hugo Chavez é importante por diversos motivos.
Primeiro, porque significa que os valores de uma esquerda mais ou menos revolucionária apelam a quem nada tem. Para os bem pensantes de uma certa direita bacoca (e esquerda ‘light’?) isto deveria ser motivo de reflexão.
Em segundo lugar, é uma lição para os EUA. Não se pode mandar em toda a gente o tempo todo. E o não reconhecimento dos resultados do acto eleitoral (para mais depois da confusão da última eleição presidencial) só mostra o tipo de gente que se encontra à frente dos destinos da maior potência mundial.
Em terceiro, é sinónimo de que a Venezuela não considera a oposição como credível. E, para quem anda há tanto tempo a atacar Chavez, também isso deveria ser motivo de reflexão. É que há que perceber que a esquerda não se combate com trauliteirices e golpes de circo, mas sim com trabalho e resultados.
AR

Monday, August 23, 2004

Talvez tenha mentido ...

... quando disse que não voltava a por poesia por estas bandas.


Poeta castrado, não!

Serei tudo o que disserem
por inveja ou negação:
cabeçudo dromedário
fogueira de exibição
teorema corolário
poema de mão em mão
lãzudo publicitário
malabarista cabrão.
Serei tudo o que disserem:
Poeta castrado não!


Os que entendem como eu
as linhas com que me escrevo
reconhecem o que é meu
em tudo quanto lhes devo:
ternura como já disse
sempre que faço um poema;
saudade que se partisse
me alagaria de pena;
e também uma alegria
uma coragem serena
em renegar a poesia
quando ela nos envenena.


Os que entendem como eu
a força que tem um verso
reconhecem o que é seu
quando lhes mostro o reverso:


Da fome já não se fala
- é tão vulgar que nos cansa -
mas que dizer de uma bala
num esqueleto de criança?


Do frio não reza a história
- a morte é branda e letal -
mas que dizer da memória
de uma bomba de napalm?


E o resto que pode ser
o poema dia a dia?
- Um bisturi a crescer
nas coxas de uma judia;
um filho que vai nascer
parido por asfixia?!
- Ah não me venham dizer
que é fonética a poesia!


Serei tudo o que disserem
por temor ou negação:
Demagogo mau profeta
falso médico ladrão
prostituta proxeneta
espoleta televisão.
Serei tudo o que disserem:
Poeta castrado não!


Ary dos Santos

Wednesday, August 18, 2004

Espírito Santo

Na altura era muito miúdo. Talvez por isso as imagens tenham ficam gravadas com mais nitidez na minha memória. Não me recordo é da altura do ano.
Todos os anos havia a festa do Espírito Santo. Nos Olivais, em Coimbra, no terreiro que ía do fundo das escadas da Igreja de Stº António até ao Pinheiro Manso, montava-se a Feira. As coisas do costume: as farturas, as loiças, os tachos, panelas e funis, as barracas com os matraquilhos e os carroceis.
Os matraquilhos intimidavam-me. Eu era pouco mais alto do que as mesas e a bola fazia um barulho seco enquanto corria de uma lado para o outro e embatia estrondosamente nas paredes do campo. E não sei como mas sujava-me sempre nos ferros lambuzados de óleo.
Do que eu gostava mesmo era dos carroceis. Principalmente o que tinha as girafas. Era enorme, com ondas, e fazia um túnel, o que era muito curioso e nunca mais voltei a ver em lado nenhum. Eu gostava das girafas. Ficava mais alto e sentia-me como uma pessoa crescida. Às vezes era minha prima Rosa, uns bons anos mais velha do que eu, que me acompanhava. Outras era o meu pai. Sentava-se na zebra que ficava mesmo ao lado da girafa ou num banco de jardim que vinha logo atrás. E o carrossel andava às voltas, às voltas, subia e descia, passava no túnel, e quando finalmente parava eu estava invariavelmente tonto mas feliz.
O terreiro do Espírito Santo é hoje uma circular da cidade. Nada deixa adivinhar as noites de festa de há 30 anos. Nem o jardim infantil do Pinheiro Manso, que ficava parcialmente dentro de um bosque e tinha a casa mais bonita de que me recordo, com as paredes forradas com pequenos azulejos azul-céu e desejos de histórias infantis. Tinha um grande relvado, que se perdia entre os pinheiros e deve ter sido o mais bonito jardim infantil do mundo.Às vezes tenho tantas saudades da feira do Espírito Santo ...
AR

Tuesday, August 17, 2004

Excesso de zelo

O Zé Maria não morreu. Foi pena. Se o tivessem deixado saltar, hoje os telejornais teriam pelo menos 20 minutos de notícias, os jornais esgotariam edições, far-se-ía um funeral de arromba (quiçá com a presença do nosso primeiro, que não perde uma para aparecer), o país estaria emocionado e haveria assunto de conversa para uma semana. Até imagino a SIC Notícias a fazer um 'Especial Zé Maria'!
Assim, nada. Nem notícias, nem lágrimas, nem Santana na TV, nem nada! Malditos agentes! Deviam-no ter empurrado!
AR

Monday, August 16, 2004

De volta

Pronto. Já se foram. As férias, quero dizer. Acabou. Pufff! Estou de volta. Ainda bem que o tempo está fraquinho. Assim não tenho tanta pena.
AR