Carta
Querida Lídia,
Espero que esta carta te vá encontrar bem. Por aqui tudo segue na mesma, os dias seguem o seu curso, ronronantes, entre algum Sol e alguma chuva.
A cidade ainda está cheia de gente, mas as férias aproximam-se e espero vê-la vazia em breve.
Penso muitas vezes no Verão passado. Penso na relva fresca em que nos sentávamos, debaixo do salgueiro, e onde fazíamos aqueles lanches infindáveis. Penso nos passeios que dávamos pelo caminho entre o bosque e o lago, onde as rãs faziam um barulho insuportável, de que bastas vezes sinto falta, e o calor era afastado pela frescura da água. Nos dias cinzentos de Inverno, quantas vezes essas imagens me deram força e alento para enfrentar a chuva, o trânsito, as multidões de gente apressada.
Lembro-me também muitas vezes do teu riso fresco. Tantas vezes o ouço na solidão das minhas noites. Tantas vezes acordo de madrugada com a certeza absoluta de que o escutei e que te encontras ali mesmo, à porta do meu quarto.
Ocorrem-me também os bilhetes que trocávamos. Os que não interessavam e cairão no esquecimento, e os que tiveram significado. Mas, principalmente, ocorrem-me os bilhetes que não escrevemos, pois são esses que falam mais alto.
Tu sabes, Lídia, como as mais das vezes fala aquilo que se não diz. E tanta coisa dissemos no que não falámos!
Vai mais longa esta carta do que pretendia. Volto a escrever para a semana, se quiseres e não te importares com os lamentos de um tolo.
Do teu, sempre
AR
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